Como surgiu a Paraíba? Quais os objetivos dos portugueses quando conquistaram seu território? Qual o papel dos índios nessa conquista? Como se deu a ocupação inicial?
Essas são importantes questões relativas à conquista da Paraíba. A maior parte da historiografia paraibana, infelizmente, trata-as de forma equivocada, preconceituosa, insatisfatória, portanto. Divulga-se, assim, uma concepção apologética da História da Paraíba, que se concentra no enaltecimento de alguns personagens (brancos europeus), elevando-os à condição de heróis e tratando nosso índios como povos inferiores, selvagens, bárbaros, preguiçosos, conforme os denominavam os portugueses.
Quando o rei de Portugal criou as capitanias hereditárias, não existia entre elas a capitania da Paraíba. O território que, aproximadamente, corresponde a atual Paraíba era ocupado pela capitania de Itamaracá, cujo donatário não teve condições de tomar conta, deixando-as praticamente inexplorada, dominada pelos índios e freqüentada pelos índios franceses que, “amigos” dos índios vinham constantemente buscar pau-brasil.
Enquanto isso, a capitania de Pernambuco, vizinha de Itamaracá, já estava muito próspera devido a grande produção de açúcar. Contudo, os senhores de engenho de Pernambuco sentiam-se incomodados pela vizinhança dos índios que habitavam Itamaracá, alegando que eles invadiam suas terras, destruíam suas lavouras e, instigados pelos franceses, os hostilizavam.
Por outro lado, ocorria que os franceses, diferentemente dos portugueses, não pretendiam tomar as terras dos potiguara e escravizá-lo, seu relacionamento com os índios era “amistoso”. Os potiguaras trabalhavam para os franceses, extraindo pau-brasil e embarcando-o em troca de objetos variados.
As hostilidades dos portugueses com os potiguaras se agravaram muito após a chamada “Tragédia de Tracunhaém.”
Esse episódio ocorreu devido ao rapto e posterior desaparecimento de um índia, filha do cacique potiguar, no Engenho de Tracunhaém (Pe.). Após receber a comitiva constituída pela índia e seus irmãos, vindos de viagem, após resgatar a índia raptada, para pernoite em sua casa, um senho de engenho, Diogo Dias, provavelmente escondeu-a, de modo que quando amanheceu o dia a moça havia desaparecido e seus irmãos voltaram para sua tribo sem a índia. Seu pai ainda apelou para as autoridades, enviando emissários a Pernambuco sem o menor sucesso. Os franceses que se encontravam na Paraíba estimularam os potiguaras à luta. Pouco tempo depois, todos os chefes potiguaras se reuniram, movimentaram guerreiros da Paraíba e do Rio Grande do Norte e atacaram o engenho de Diogo Dias. Foram centenas de índios que, ardilosamente, se acercaram do engenho e realizaram um verdadeira chacina a morte de todos que encontraram pela frente: proprietários, colonos e escravos, seguindo-se o incêndio do engenho.
Mediante tal fato e os angustiosos apelos de habitantes de Pernambuco, o rei de Portugal criou a Capitania Real da Paraíba, desmembrando-a da capitania de Itamaracá.
Às vésperas do início das tentativas de conquista da Paraíba, habitavam seu território duas tribos indígenas, separadas apenas pelo Rio Paraíba. Além dos potiguaras, que já habitavam a Paraíba, vieram da região do Rio São Francisco os tabajaras. Havendo sofrido traição de portugueses Pirajibe, chefe dos tabajaras, resolveu abandonar a aldeia onde morava e, após percorrer o interior, chegou à Paraíba com sua tribo.
Assim, potiguaras e tabajaras dividiam entre si a capitania da Paraíba. Ao norte o Rio Paraíba habitavam os potiguaras e ao sul os tabajaras. Em 1585, os tabajaras estavam aliados aos potiguaras impedir a conquista da Paraíba.
Criada a Capitania Real da Paraíba em 1574, apenas em 1585 efetivou-se sua conquista e ocupção.
Ora, por que tanto tempo? Mais de dez anos de lutas! Quais as dificuldades?
A dificuldade maior era a resistência dos índios, sua combatividade, sua coragem. Apenas de consideras inferiores, lutavam bravamente para impedir a perda de seu território e evitar que fossem escravizados pelos colonos.
Durante mais de dez anos, foram realizadas mais de cinco tentativas de conquista. Não vamos aqui narrar cada uma das expedições. Episódios variados marcam cada investida dos colonizadores. Ataques dos índios e desvios de rota foram os fatos mais freqüentes.
Ocorreu até um fato inusitado: por conta das más condições da navegação houve a devolução de uma frota ao porto de origem.
As lutas entre os conquistadores e os índios foram muitas e, freqüentemente, os índios levavam vantagem. De início, as expedições eram organizadas apenas por portugueses. Porém, com a dominação da Espanha sobre Portugal, a partir de 1580, alguns espanhóis juntaram-se aos portugueses nas tentativas de conquista da Paraíba.
A associação de portugueses e espanhóis visando a conquista, ao invés de facilitá-la, dificultou-a muito mais. Os desentendimentos entre eles eram freqüentes. Entravam em conflito, concorrendo pelo comando das operações de guerra e da administração pessoal. Assim, as desavenças entre portugueses e espanhóis contribuíram para retardar mais ainda a conquista.
A conquista definitiva da Paraíba somente foi possível, quando os portugueses conseguiram a adesão dos tabajaras em luta contra os potiguaras. Aproventando-se do desenvolvimento entre as duas tribos, o ouvidor-geral Martin Leitão enviou emissários a Pirajibe (ou Braço de Peixe, cacique tabajara) oferecendo-lhe aliança contra as tribos potiguaras.
Assim, com a ajuda dos tabajaras, os colonizadores conseguiram iniciar a ocupação da terra. Daí em diante, assiste-se a um verdadeiro extermínio, cada vez que os índios resistiam eram mortos em massa. Tratava-se de fazer a “limpeza do terreno”, como afirmavam os portugueses e nos informa o historiador Horácio de Almeida:
“Em fins de janeiro estavam todos de volta ao interior. Agora ia ter começo o povoamento da Paraíba, porque este era o principal objetivo depois das escaramuças militares, que se impunham como limpeza do terno para desenvolvimento da conquista”. (ALMEIDA, 1978:93).
Os índios que colaboraram com os colonizadores e os que a eles se renderam foram utilizados como mão-de-obra na lavoura, nos engenhos e na construção de obras para a edificação da cidade de Nossa Sra. das Neves (atual cidade de João Pessoa).
Além dos colonizadores, não podemos esquecer o papel da Igreja nessa conquista. Religiosos de diversas ordens: jesuítas, franciscanos, carmelitas e beneditinos, através das chamadas missões, “domesticavam” os índios ou seja, “faziam sua cabeça” para a aceitação do domínio do homem branco, para a perda de seu território e de sua própria identidade.
Vejamos como poeta Luiz Nunes Alves, autor da História da Paraíba Em Versos, relata os fatos ocorridos a 5 de agosto de 1585 com a celebração da paz com os tabajaras:
“Dois meses depois da luta
João Tavares conquistou
Pirajibe e sua tribo
E com ele reatou
Relações de amizade,
Que com muita vaidade,
Martin Leitão festejou,
A benfazeja aliança
O inimigo atacava
E o desejo comum
Dia a dia se arraigava
Visando a um só ideal
O núcleo colonial
Que então se iniciava.
E o marco da conquista
Sem dúvida estava ficando
Por soldados, jesuítas
Muito bem testemunhado
Sob as bênçãos de Jesus
A fé ergueu uma cruz
Tudo estava iniciado.”
______________________________________