O Museu da República abriu ao público que circula diariamente pelas suas dependências um acervo coletado desde 1985 pela extinta Fundação Nacional Pró-Memória, até o encerramento dos trabalhos da Assembleia Constituinte, em 1988. A exposição 25 Anos da Constituição Cidadã foi inaugurada hoje (3), como parte do projeto Painéis da República. No sábado (5), a Constituição Federal faz 25 anos.
Segundo os pesquisadores do museu, Elizabeth Sussekind e Marcus Macri Rodrigues, a mostra reúne em torno de 5,5 mil cartas de brasileiros de todas as condições sociais, enviadas de vários lugares com sugestões, dúvidas e reivindicações que a equipe da Fundação Nacional Pró-Memória encaminhava aos
constituintes. “Raramente elas eram escritas à máquina”, disse Elizabeth: “Foi um projeto que democratizou a Constituição.”
A esse material se somam enquetes feitas nas ruas pelos pesquisadores do
Pró-Memória durante as reuniões, no Rio, da Comissão Provisória de Estudos
Constitucionais (CEC), para saber a opinião da população sobre os assuntos
polêmicos em debate, entre os quais o aborto, a situação dos trabalhadores
rurais e dos índios, além de os direitos da mulher. A CEC era conhecida, também,
como Comissão Afonso Arinos ou Comissão dos Notáveis, porque era presidida pelo
senador Afonso Arinos de Mello Franco e composta por 50 juristas e
representantes de diversos segmentos da sociedade. Os “gazeteiros”
[parlamentares eleitos para elaborar a nova Constituição] da Constituinte também
foram objeto de enquete. “Até pena de morte saiu”, lembrou Elizabeth. “A gente
tinha uma riqueza de informações.”
O Centro Pró-Memória da Constituinte (CPMC) do Rio de Janeiro foi aberto no
dia 10 de março de 1986 e funcionou durante dois anos, no térreo da antiga
Companhia Docas de Santos, atual sede do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (Iphan). O espaço tinha as paredes cobertas por painéis de
artistas plásticos, com suas visões críticas sobre a Constituinte. “As pessoas
passavam e perguntavam: ‘O que estão falando hoje na Constituinte? O que estão
resolvendo?’”, contou Elizabeth Sussekind. Foi a partir dessa curiosidade
popular que ela e outros colegas da Fundação Nacional Pró-Memória decidiram
abrir o projeto chamado A Montanha Vai a Maomé.
“Nós íamos para os lugares de difícil acesso ou inusitados, no sentido de que
as pessoas não teriam ido ou se comunicado, como penitenciárias, Fundação
Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem), favelas, Feira de São Cristóvão, e
levávamos um computador que a (empresa) Cobra nos emprestou e mostrávamos para
as pessoas o que estava ocorrendo na CEC”, lembra Sussekind.
A ação conseguiu quebrar a resistência das pessoas e mesmo as mais
desconfiadas ou descrentes do trabalho da Comissão Constituinte decidiam mandar
algum recado. A equipe elaborou um questionário que coletava as opiniões da
população. “Nós éramos uma ponte”.
Os relatórios eram digitalizados à noite. Pela manhã, os pesquisadores do
CPMC repassavam esse material para todos os interessados. Elizabeth disse que
professores universitários, políticos e até governadores solicitavam cópias que
eram entregues pessoalmente ou enviadas pelo correio, sempre gratuitamente. O
serviço era prestado também por telefone.
A equipe do CPMC resolveu também produzir pequenos folhetos de uma página,
pedindo a opinião popular que, por meio de convênio, foi encartado nos volantes
de loteria esportiva e santinhos de igreja. “Começamos então a costurar uma
participação popular que fosse bem significativa”. O trabalho foi apoiado pelos
veículos de imprensa de todos os segmentos à época: jornal, televisão e rádio.
Do acervo fazem parte recortes de notícias publicadas pelos jornais e gravações
do programa radiofônico do governo federal A Voz do Brasil, que dedicava parte
de seu horário diário às notícias da Comissão dos Notáveis e da Assembleia
Constituinte.
O acervo foi levado para o Museu da República em 1990 e exposto pela primeira
vez em 2008, com recursos da Fundação Ford, dos Estados Unidos. “Agora, estamos
querendo dar destaque e colocar à disposição do público esse acervo”. A
exposição ficará aberta até o dia 3 de novembro. Ela será sucedida, depois, por
outra mostra, intitulada Trabalho, Luta e Cidadania: 70 Anos da CLT,
informou Marcus Macri Rodrigues.
Edição: Marcos Chagas
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