O Prosa, Poesia e Arte apresenta hoje O Trem da Lavanderia, mais um poema do cubano Miguel Barnet, com tradução inédita em português. Nascido em La Habana, em 1940, Miguel Barnet Lanza, conhecido por sua novela-testemunho Biografia de um cimarrón (1966), é um dos escritores cubanos de maior sucesso internacional. Sua obra está traduzida em várias línguas.
Em 1994, recebeu o Prêmio Nacional de Literatura de Cuba. Entre seus livros de poesia estão: La sagrada familia (1967), Orikis y otros poemas (1980) e Poemas chinos (2018), de onde se extraiu O Trem da Lavanderia. Trata-se de um poema em prosa de insólita delicadeza, que usa a linguagem para mesclar sentidos e intersecções entre sensações muito intensas do eu-lírico, que se vê diante de um grupo de trabalhadores de uma lavanderia.
A tradução para o português é do poeta Alexandre Pilati, professor de Literatura da Universidade Brasília (UNB) e colaborador do Prosa, Poesia e Arte. Confira o poema.
O trem da lavanderia
(Miguel Barnet)
Adentro este galpão de sombras. Tropeço em alguma cesta. Somente eu gesticulo, somente eu falo. Cheira a folhas de hortaliça, a repolho. Estendem um lençol branco, de aipo. Cheira a terra úmida, a verduras, a incenso de séculos, balsâmico. Um cão lambe uma casca de manga. Há paz neste templo da Ásia. Parece que ninguém escuta, ninguém olha.
Apenas se passa a ferro. As toalhas, no pátio, quaram ao sol, como folhas de taioba. A chuva cai pelas fendas do teto, orvalha os nódulos de roupa branca.
Amo o silêncio taciturno deste idioma de cabeças amarelas. Joaquim Li, Francisco Wong, Alfredo Jo, sonham interminavelmente um sonho profundo que não se assemelha ao nosso, enquanto passam a ferro.
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