( carta aberta para um determinado professor)
Caro Professor.
Soube, através de meu filho, que em uma de suas aulas, o senhor teria com a severidade tão peculiar de nossos mestres, reproduzido em suas explanações os inúmeros eventos que se deram no sul do país, rotulando – os como se fazem costumeramente apenas como os “paulistas” os desbravadores e colonizadores por todo o sul, daqui ao Prata. Esquecendo que éramos nós os “paulistas do sul” ( até 1853). Escorregão. As escorregadelas de professores e historiadores sempre trazem seqüelas.
A botina da história do sul do Brasil, trás a lama dos caminhos abertos por curitibanos, caro professor. Desbravando, colonizando, enfrentando chuva, frio, geada, os índios e os castelhanos, com quem a nossa brava gente curitibana teve contato, e com quem iniciamos, da parte de Portugal, como changadores e tropeiros, a efetiva presença naquela região, onde ajudaríamos a fundar as primeiras povoações.
Partiu daqui navegando de Paranaguá, Domingos de Brito Peixoto, fundou Laguna e dali, percorrendo por terra foi até onde o mar encontra o “rio de la Plata”.
Manoel Lobo funda a Colônia do Sacramento em frente a Buenos Aires. Este pedaço da história remonta a 1680, ou seja a mais de 320 anos atrás.
Alguns historiadores teimam em escamotear . Querem nos fazer crer que a historia da colonização do sul do Brasil teria inicio ainda no século passado ou quando muito no final de 1700, esquecendo ou fazendo esquecer que foi a partir de Laguna, através de João de Magalhães, que era genro de Domingos de Brito Peixoto, aquele mesmo que como disse a instantes a trás que teria saído de Paranaguá, abrindo um caminho dali até o Prata, traria os primeiros muares lá de Sacramento. O problema é como trariam as bestas e mulas até aqui.
Por volta de 1716, vinte e um anos antes da estimulada imigração de famílias açorianas para a recém criada capitania de São Pedro do Rio Grande (1737), estes desbravadores fundam Tramandaí e na mesma época um outro membro da expedição que partira dos Campos Gerais de Corytiba, Cosme Velho se estabelece no que viria a ser o Viamão, tanto uma como outra lá no atual Rio Grande do Sul. Alias, chegando nossos irmãos curitibanos no alto da serra de Vacaria, viram os rios da planície e que teriam o formato de uma mão aberta. Daí o vi-a-mão.
Começavam os caminhos das tropas, o troperismo, de fundamental importância, na formação de nossa gente e da nossa cultura.
A partir de 1731, nossa economia centrou-se no comercio do gado que buscávamos nos campos de Sacramento e Viamão ou em Corrientes na Argentina e levávamos até Sorocaba.
Nós curitibanos, rasgamos todo o sul, abrindo estradas que saindo de Curitiba, nos ligava a Guarapuava, Palmas, Chapecó e ia diretamente a Corrientes. Sempre a cavalo, vestidos com bombacha, usando botas de couro cru e esporas de largas presilhas, às quais nós curitibanos chamávamos de “chilenas”, trazendo na cintura, a guaiaca e junto dela a faca e garrucha. Levávamos mate aos platinos e na volta trazíamos gado e muares. Levávamos nossa musica, nossa viola fandangueira atira colo nas tropiadas, a mesma musicalidade parte sonora de nossa cultura que espalhamos por todo o sul e que encantou o naturalista e escritor francês Saint Hilaire, que nos Campos Gerais de Corytiba, 1820 em uma das muitas festas que presenciou, tendo a oportunidade de ver “os convivas dançarem aos pares danças denominadas na região de anu e chula, em que os dançarinos fazem uma espécie de sapateado, dobrando os joelhos…” Bem, ai já é outra história que alguns professores e outros tantos historiadores esquecem ou fazem esquecer.
Queira desculpar o mal jeito professor, é apenas o jeito de um curitibano que busca reavivar a cultura de nossa terra e porque sabe que um povo que não tem memória não tem amanhã. E se o senhor permitir, ao sabor de nosso mate, volto ao assunto. Até logo.
CLÁUDIO RIBEIRO
Compositor/ Jornalista
Faça um comentário