Comparada com a tradição dos Estados Unidos e de alguns países da Europa, a educação domiciliar ainda é tímida no Brasil. As famílias que apostam neste tipo de aprendizado – em que a criança estuda em casa e não na escola – enfrentam dificuldades pessoais e legais.
Por lei os pais são obrigados a matricular seus filhos na rede regular de ensino a partir dos 6 anos de idade até a conclusão do ensino médio. Aqueles que não o fazem, se arriscam a sofrer punições da Justiça, incluindo o pagamento de multas, e podem ser obrigados, judicialmente, a matricular os filhos na escola. Márcia Pereira da Rocha, da Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc), explica que a escolarização faz parte da formação da criança e do adolescente. “A posição do Ministério Público é que a criança não pode ser submetida a modelo educacional não permitido no Brasil”, defende.
O argumento dos adeptos na luta pela regulamentação da modalidade é de que as famílias brasileiras possam ter liberdade para escolher como querem educar seus filhos. Márcia admite que esta é uma reivindicação justa. “As pessoas têm direito de discutir coisas mais amplas. Nosso Congresso é um bom lugar para apresentar temas como este”, diz.
Sabrina Campos tem três filhos e defende o homeschooling – nome que se dá à prática no exterior. Seu filho mais velho tem 11 anos e desde os 8 não frequenta a escola. “Entre 10 meses e 8 anos de idade, Gabriel passou por oito escolas. Aqui no Brasil, no exterior, colégios públicos, com diferentes linhas pedagógicas. Quando a filosofia era interessante, existiam problemas de segurança”, argumenta. Um dos motivos que levou Sabrina a optar pelo ensino domiciliar foi o bullying que o menino sofria. Ela argumenta que nenhuma escola conseguiu dar a assistência necessária para Gabriel, que é superdotado. “As instituições não formam professores para lidar com isso”, desabafa.
Um ponto de preocupação dos educadores sobre o ensino doméstico é em relação à socialização da criança. A educadora Maria do Pilar Lacerda, diretora da Fundação SM e ex-secretária de educação básica do MEC, acredita que fora da escola a convivência da criança com outras pessoas da mesma idade fica limitada. “A escola é o lugar mais importante para se conhecer o diferente. A criança que não a frequenta pode crescer com visão reduzida do que é o ser humano”, argumenta. A questão, porém, não preocupa os que optam por este tipo de ensino. Sabrina garante que seus filhos se relacionam com outras pessoas em atividades, cursos e no próprio dia-a-dia.
Outra crítica feita por quem defende a prática é o currículo limitado das escolas. Sabrina defende que a criança tem que ver sentido no que está estudando e não “acumular informações desnecessárias para sua vida”. Já Pilar, garante que não há como prever se um conteúdo escolar será útil para o aluno ou não. “Daqui a 30 anos, 80% das profissões serão diferentes das que existem hoje. Mas concordo que o currículo escolar deva ser mais contemporâneo. Do jeito que está, não dialoga com esta geração”, pontua.
Gabriel, o filho de Sabrina, coleciona bons resultados. Foi o primeiro apresentador de TV de programa de culinária infantil e o palestrante mais jovem do TED, conferência internacional sobre inovação. A educação individualizada é uma das vantagens do homeschooling, na opinião do deputado Lincoln Portela (PR/MG), autor de projeto de lei (PL 3179/12) que defende que fique a critério dos pais ou responsáveis pelo aluno decidir se o aprendizado deve ocorrer em casa ou na escola.
No fim do ano passado, a proposta do parlamentar foi aprovada pela Comissão de Educação e Cultura na Câmara dos Deputados. O projeto aguarda, ainda, análise da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Proposta semelhante já havia sido rejeitada pela CEC um ano antes.
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