Coral das Lavadeiras de Almenara
CD
O canto delas lava a alma de quem ouve. O Coral das Lavadeiras de Almenara, formado por nove senhoras entre 50 e 80 anos, e que chega ao segundo CD, experimenta o gosto do sucesso, do Vale do Jequitinhonha, nordeste de Minas, a Portugal, onde realizou turnê no ano passado, mudando bastante a rotina de Adélia Barbosa da Silva, Ana Isabel da Conceição, Emília Maria de Jesus, Juracy Lima da Silva, Mirian Fernandes Pessoa, Santa de Lourdes Pereira, Sebastiana Dias Silva, Tereza Novais e Valdenice Ferreira dos Santos.
Com arranjos do cantor, compositor e pesquisador Carlos Farias, responsável pela idealização do coral das lavadoras-cantoras, o CD “Aqua” será lançado hoje à noite no BDMG Cultural, em Belo Horizonte. Amanhã, as donas da voz levam sua alquimia sonora ao Coreto da Praça da Liberdade, às 19h30, ao lado de outros corais integrantes do projeto “Quatro Cantos”, entre esses o Angelus, o BDMG e o Canto Livre, de Betim.
“As lavadeiras são guardiãs de antigas canções, cuja origem vem se perdendo na memória. São cânticos de trabalho, lúdicos e de louvação, heranças de antigos canoeiros, ribeirinhos, caboclos, tropeiros e colonizadores. Além disso, são também retratos poéticos da alma de Minas, que mostram uma fusão rítmica de elementos negros, indígenas e portugueses, reveladores de nossa brasilidade” _ salienta Carlos Farias.
A diversidade rítmica e melódica destas intérpretes genuinamente populares pode ser escutada em autênticos batuques, sambas, chorinhos, afoxés, frevos, cantigas de roda, toadas e modinhas. Em 2002, capitaneadas por Farias, elas gravaram o primeiro disco, “Batukim Brasileiro”, lançado até mesmo em Portugal, quando as lavadeiras se apresentaram na Ilha de Madeira, convidadas pelo governo lusitano como atrações do 3º Festival de Arte, Criatividade e Recreação.
“Estamos pesquisando esta herança musical desde 1985. Com a criação do Coral, em 1991, as lavadeiras se tornaram fiéis depositárias e intérpretes de um saber que encanta pessoas em todo o Brasil e no exterior. O trabalho delas é uma forma de enriquecer o patrimônio cultural imaterial brasileiro, gerando renda e promovendo inclusão social”, afirma Farias.
Na visão do cantor e compositor, “Aqua” despe a maturidade das senhoras do Jequitinhonha. “Além das questões ecológicas, também presentes no álbum anterior, neste elegemos a água como tema. Fonte de vida e ingrediente fundamental para o trabalho das lavadeiras, ela permeia várias canções do disco. Os ritmos e as letras também revelam a miscigenação e o sincretismo religioso dos brasileiros”.
Sagrado e profano se misturam nas 13 faixas do CD, que conta com participações especiais de Rubinho do Vale e Pereira da Viola, artistas comprometidos com as raízes da cultura popular brasileira.
Tereza Novais, uma das lavadeiras-cantoras, nunca se esqueceu da primeira vez que viu Farias. Em Almenara, as lavadeiras encontravam-se às margens do rio Jequitinhonha e, enquanto realizavam seus ofícios domésticos, punham a vida e a prosa em dia, aproveitando para relembrar antigas canções, passadas de mãe para filha, ao longo das décadas. “Apareceu aquele rapaz arrumadinho, que se interessou pelo que a gente fazia e cantava. Era o Carlos, e a vida da gente mudou desde aquele dia”, afirma Tereza.
Adélia Barbosa da Silva conta que aprendeu as músicas com sua mãe. “E ela ouvia tudo isso da boca da mãe dela. Desde pequena, sabia tudo de ouvido, de tanto a gente imitar e escutar. Hoje eu fico muito feliz de poder agradar tanta gente”, conta. “A gente fica toda, toda, de poder cantar pra tanta gente, de escutar tanto carinho da boca dos outros. Imagina, fio, gente que a gente nunca viu antes” _ complementa Santa de Lourdes Pereira.
“Aqua” _ Lançamento do CD de Carlos Farias e Coral das Lavadeiras de Almenara. Hoje, a partir de 19 horas, no BDMG Cultural (Rua Bernardo Guimarães, 1600). Amanhã, às 19h30, no Coreto da Praça da Liberdade.