No novo longo (ops!), longa de Arnaldo Jabor, a felicidade do povo brasileiro é apresentada através de inúmeras manifestações populares: seja a anarquia do carnaval, a insanidade do artista, a doença social ou o romantismo melancólico de alguns bairros e personagens clichês do Rio de Janeiro.
Ora, Jabor sabe melhor do que ninguém que se as pernas de Garrincha não fossem tortas, não entortariam os adversários… Jabor sabe que se Aleijadinho não fosse aleijado, talvez não tivesse o poder de superação que o transformou num dos maiores artistas brasileiros. Jabor sabe que o brasileiro ama reconhecer em seus semelhantes o seu poder de superação: daí a eleição de Lula e Dilma (que, nesta ordem, deixaram a pobreza e os porões do DOPS para ocupar a presidência). Jabor parece ter inveja de quem consegue conquistar as coisas na gambiarra. Para pessoas como ele, o Brasil é terra que assusta, que contém cenas fortes que deflagram injustiças, mortes, sexo, vícios e paixões. Mas agora, ele ri de tudo isso, pois sabe que essas cenas fortes estão ficando cada vez mais escassas em nosso país, graças ao crescimento econômico e desenvolvimento social que alcançamos nos últimos vinte anos. Jabor, com esse filme cheio de seios nus, apresenta o epílogo desse Brasil velho (e, consequentemente, do Cinema Velho… quer dizer, Novo) e se dá por vencido: ele diz quase sem querer, “amigos, apesar de odiá-los e não entende-los, eu fui feliz”.
O Brasil de hoje, que tenta restringir instintos e vícios – seja através do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Lei Seca, das leis antitabagistas ou até mesmo através da profissionalização das prostitutas,- é a imagem de um país que Jabor gostaria de ter vivido a vida toda… e que é tão chato quanto as suas sobrancelhas céticas. Mas por baixo da carranca dura, mora no peito desse crítico o mesmo coração capaz de escrever o belo livro de crônicas “Amor é prosa, sexo é poesia”. Por isso, acredito que Jabor tenha saudades do Brasil que conheceu em sua adolescência. Só isso justificaria tamanha necessidade de nos mostrar a beleza que se esconde por trás de certos dramas, a ponto de exagerar nos monólogos e nos encharcar com tantas nostalgias. Afinal, ele sabe que neste país politicamente correto que está nascendo (e que de certo modo, ele ajudou a construir), não há espaço para certos amores, certos odores, certas dores rodriguianas que o tempo levou.
Jabor tenta entender desde pequeno a felicidade de um povo triste e subdesenvolvido e agora nos pune por ter nascido no país do cruzeiro, apresentando-nos um filme que – assim como a vida -, nos incita o riso, o choro e o tédio. As cenas de melodrama fortuito passados na telona são até coerentes, pois nosso povo adora uma novela: é bagunceiro, é espalhafatoso, é debochado e falastrão. Nesse momento, reconhecemos no filme o crítico mordaz que transforma o ceticismo em um estilo de vida. Como esse povo, esse mesmo povo que batuca, se esfaqueia, se lambe, se entrega de mão beijada pode ser assim tão feliz? Como pode o povo brasileiro fazer alguém como Jabor ser tão feliz? Se essa não é a Suprema Felicidade, eu não sei mais sobre o que esse filme fala…
João Pedro Roriz é escritor e jornalista
www.jproriz.blogspot.com
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