A exposição Transver apresenta fotografias produzidas por deficientes visuais na Pinacoteca de São Paulo, como resultado de um curso realizado no local e ministrado por João Kulcsár. Com diferentes graus de deficiência visual, dez participantes aprenderam a lidar com o equipamento, a desenvolver competências básicas e a perceber o espaço por meio dos outros sentidos.
“Para mim, é inédito. Eu não esperava. Quando me ligaram para dizer que minha foto foi escolhida, eu fiquei contente, fiquei emocionado. É uma experiência muito boa, está sendo uma novidade e tanto”, disse Jesus Pereira Caldas, 50 anos, que terá sua fotografia exposta. Ele perdeu completamente a visão em 2004 por causa de um glaucoma.
No curso, Jesus teve a oportunidade de ter uma fotografia sua transformada em relevo, para que pudesse perceber a paisagem que havia fotografado. “Sentimos como é a nossa foto, como é a foto que tiramos, pelo tato”, recordou.
O professor Kulcsár, que desde 2008 trabalha a fotografia com deficientes visuais, também coordenou a exposição. “A ideia é que as pessoas, refletindo sobre o que é uma exposição do deficiente visual fotografando, possa pensar que tudo pode ser feito. Tudo pode ser aprendido, tudo pode ser expressado”, disse.
Segundo Kulcsár, a mostra dá voz a deficientes visuais para se expressarem por meio da fotografia. A princípio, a ideia parece um paradoxo, mas ele explicou que a imagem pode ser construída com base nos outros sentidos. “Ele [aluno] percebe que através dos outros sentidos, ele pode fotografar. Um fotógrafo vidente sensível, quando vai a um espaço, não apenas olha. Ele sente o cheiro, o calor. Os outros sentidos são aflorados. Então pensamos que o deficiente visual pode usar os outros sentidos para se expressar”, acrescentou o professor.
“Eu escolhi os objetos para fotografar lá [no curso] assim: o professor descrevia o objeto, como uma estátua, e falava em que posição estava. Ou uma árvore, então falava que estava com as raízes expostas, que era larga, precisaria de seis pessoas para abraçá-la. Aí, eu montava a imagem na minha cabeça e escolhia”, relembrou Jesus.
Depois de definir o objeto, o fotógrafo e media a distância por meio de passos e batia a foto. Ele destacou o aprendizado que teve para tirar fotos 3×4, aquelas pequenas, usadas em documentos. “O que me chamou a atenção lá foi a foto 3×4, que eu não sabia como tirar e aprendi. Eu coloco a máquina em baixo do queixo, vou até a pessoa, coloco a minha mão esquerda no ombro dela, estico o meu braço e essa é a distância que eu meço. Aí, bato a foto, e sai nítida”, contou.
Kulcsár ressaltou a capacidade dos alunos em apreender as características do ambiente e dos objetos e colocá-las nas fotografias. “Ele pode tocar em uma estátua, sentir o calor, o sol batendo em uma determinada parede, sentindo a diferença do calor, os sons que vêm de determinado espaço. Então, ele pode perceber que, por meio dos outros sentidos, pode transformar aquela percepção em imagem e em expressão visual”, explicou.
As fotografias terão relevo e audiodescrições, além de textos em braille. Por meio de um código QR, também será possível assistir aos depoimentos gravados pelos artistas participantes da mostra, que contam sua perspectiva da fotografia.
A exposição fica em cartaz até 3 de abril de 2016. O ingresso custa R$6 (inteira) e R$ 3 (meia).
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