História da Bienal da UNE aponta poder de mobilização de estudantes e artistas

Criar um espaço para o diálogo entre o movimento estudantil e o movimento cultural. Foi com esse intuito que a União Nacional dos Estudantes (UNE) fundou, em 1999, um evento que atraísse estudantes que não estavam articulados na rede
formal do movimento estudantil, composta por Centros e Diretórios Acadêmicos (CAs, DAs e DCEs). A iniciativa não era nova e se inspirava no Centro Popular de Cultura (CPC), fundado pela UNE em 1961 e fechado pela ditadura militar três
anos depois. Mesmo curta, a experiência deixou como legado um exemplo da força
da mobilização conjunta de artistas e estudantes, fazendo correr pelo país os
anseios por reformas estruturais.

“O CPC demontrou o poder da união entre as forças mobilizadoras que emanam da
cultura e dos estudantes. Nessa época, vários artistas se aproximaram das
demandas apresentadas pelo movimento estudantil”, aponta Maria das Neves,
diretora de cultura da UNE. Pelo CPC, passaram figuras como o teatrólogo
Gianfrancesco Guarnieri, que produziu a peça Eles não usam black-tie; o
escritor Ferreira Gullar, autor de diversas poesias e crônicas; e os cineastas
Joaquim Pedro de Andrade, de Marcos Faria, Cacá Diegues, Miguel Borges e Leon
Hirszman, que produziram o filme Cinco Vezes Favela.

No espaço de tempo que separou o fim do CPC e a criação Bienal da UNE, o
vínculo entre estudantes e artistas nunca foi totalmente suspenso, se vinculando
através do apoio à cultura popular e das campanhas pelo direito à meia-entrada.
Entretanto, é partir da Bienal que a UNE retoma seu objetivo de revelar ao
Brasil manifestações artísticas inovadores e vinculadas com os processos
políticos e sociais em curso no país. O evento é hoje um espaço propício para a
iniciação artística. “Os artistas que se apresentam ganham experiência para se
participarem em outros eventos deste porte e têm a oportunidade de estabelecer
contatos promissores. Alguns seguem carreira, outros não. Há bandas
universitárias que se apresentaram em outras edições e já fazem sucesso em seus
estados”, diz Maria das Neves.

Poder mobilizador

A Bienal parte de um entendimento de que o movimento estudantil deve
mobilizar um rede mais diversificada. “A falta de interesse em participar de uma
passeata não significa falta de engajamento ou descompromisso político. Há
muitos estudantes que não estão dispostos a participar de manifestações ou
integrar os CAs, mas organizam periodicamente uma roda de samba que reúne um
grupo fixo de pessoas. A linguagem cultural tem um poder contagiante. Muitas
vezes, um discurso oral não choca tanto quanto uma música ou uma peça de
teatro”, explica Maria das Neves.

A história do evento deixa em evidência o poder de mobilização da cultura.
Chegando a sua 8ª edição, a Bienal já mobiliza um público maior que o Congresso
da UNE. Estima-se que 10 mil pessoas circularão diariamente pelas atividades da
programação.

Nesse processo de mobilização contínua, a Bienal contou com o reforço do
Circuito Universitário de Cultura e Arte (CUCA), fundado pela UNE em 2001.
Segundo Maria das Neves, a iniciativa teve como objetivo proporcionar um fórum
permanente para o debate cultural e um espaço para a criação artística dos
estudantes. Em 2002, o CUCA foi contemplado no Programa Pontos de Cultura,
lançado pelo então ministro da Cultura, Gilberto Gil. A partir de então, o
circuto se desenvolve, criando ramificações em vários estados e promvendo um
diálogo cultural entre estudantes e socidade.

 

A Bienal da UNE já passou por lugares conhecidos pela sua efervescência
cultural, tais como a Lapa e o Pelourinho. Ao todo, cinco cidades já sediaram o
evento, algumas delas mais de uma vez: Salvador, Rio de Janeiro, Recife, Olinda
e São Paulo. Nos seus 14 anos, a Bienal proporcionou o encontro de estudantes e
novos artistas com renomados personagens do cenário artístico do Brasil.
Gilberto Gil, Oscar Niemeyer, Ariano Suassuna, Augusto Boal, Ziraldo, Jorge
Mautner, Alceu Valença, Marcelo D2, Martinho da Vila, Lenine e Naná Vasconcelos
são alguns dos nomes que trocaram experiências com os participantes das edições
passadas.

Ao longo de sua história, o evento buscou ainda aliar o debate cultural às
questões sociais e políticas da formação do povo brasileiro e da identidade
nacional. Enquanto neste ano está em foco os processos migratórios do povo
nordestino, em outros momentos já foram discutidas, por exemplo, a relação entre
o Brasil e a África e a integração latino-americana.

Compartilhar:

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*