Festival de Berlim aplaude filme sobre as ocupações estudantis em SP

A estreia mundial do documentário “Espero tua (re)volta” aconteceu sob aplausos, no sábado (9), na mostra Geração, da 69ª Berlinale – o tradicional Festival de Filmes de Berlim. A seção é dedicada a filmes sobre adolescentes, e voltados ao público infanto-juvenil.

Nayara Souza, filiada à UJS e ao PCdoB, é uma das três protagonistas do documentário “Espero tua (re)volta” Nayara Souza, filiada à UJS e ao PCdoB, é uma das três protagonistas do documentário “Espero tua (re)volta”

A documentarista Eliza Capai assina a direção do filme, que acompanha a ocupação de escolas em São Paulo, em 2015, por estudantes secundaristas contrários às medidas anunciadas pelo então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).

 

A gestão tucana previa o fechamento de quase cem escolas e o remanejamento de 311 mil alunos e 74 mil professores. Foram quase 60 dias de ocupação de quase 200 escolas. O governo paulista recuou e cancelou a medida. No ano seguinte, em 2016, um novo escândalo – o das merendas – agita novamente os estudantes, que ocupam a Assembleia Legislativa.

 

Eliza Capai diz foi cativada pela “potência” e a “esperança” desses estudantes, que conseguiram reverter a decisão do governo. Além disso, o movimento também se espalhou pelo Brasil.

 

Com imagens de arquivo, três protagonistas – Lucas “Koka” Penteado, Nayara Souza e Marcela Jesus – recontam o que viveram, com a linguagem e a paixão dessa idade. “Entrevistei estudantes do Brasil todo, de correntes políticas diferentes, tentando entender quais eram as questões centrais. De alguma forma, cada um deles representa partes muitas grandes desse movimento”, relata a diretora.

 

O documentário também recua alguns anos para chegar a 2013, quando São Paulo parou por causa do Movimento do Passe Livre, contra o aumento da tarifa de transportes. A intenção da diretora é explorar os protestos não como pretextos por si só – mas como preâmbulos das lutas estudantis que tomariam várias capitais brasileiras nos anos seguintes. Daí o avanço para o golpe contra Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro.

 

Tendo como público alvo os jovens, Eliza brinca que fez um videoclipe de 93 minutos. “O ritmo é acelerado. Fizemos grupos de estudo para saber quanto tempo eles conseguiam ficar olhando para a tela”, uma vez que é uma geração acostumada a ver séries.

 

Eliza Capai conta que foi um longo processo de confecção do roteiro, cada um dos três estudantes contando suas impressões e vivências pessoais. De opiniões às vezes divergentes, à margem das ações foram surgindo vertentes importantes, como a questão racial, a causa LGBT e posições políticas. “Foi uma parceria muito legal, refletimos sobre o que contar e como”, explica.

 

A cineasta constatou que “a dificuldade do movimento secundarista é da continuidade, pois eles ficam só três anos na escola”. Ela acrescenta que o filme vem com o desejo de virar um documento para os mais novos, “no sentido de mostrar o que fez essa geração, desde as estratégias de luta até as consequências emocionais”.

 

“Estou muito feliz de estar na Mostra Geração 14+ em Berlim, que dialoga justamente com os secundaristas alemães”, afirma Eliza. “Berlim é uma cidade com uma história imensa, é um local que dividiu o mundo em dois há pouco tempo. Não sei se a juventude de lá possui os mesmos questionamentos da nossa.”

 

Os protagonistas do filme também nutrem expectativas. “Olho muito para trás e penso que tudo o que sou hoje foi graças ao movimento de ocupação”, diz Marcela Jesus, hoje com 19 anos, que está em Berlim para a apresentação do filme no festival.

 

Atriz, ela participa de um grupo chamado Coletivo Ocupação, formado por ex-secundaristas das ocupações de 2015. “Assumi minha ancestralidade, meu cabelo, minha negritude. A ocupação me ensinou a não ter medo, a me impor”, conta Marcela.

 

A outra estudante retratada no documentário, Nayara Souza, é filiada à UJS (União da Juventude Socialista) e ao PCdoB. “A Nayara era a personagem que eu conhecia há mais tempo, porque ela estava dentro da ocupação da Alesp, onde começou o filme. Na última gravação oficial da ocupação da câmera, eu presenciei a forma de liderança da Nayara”, afirma Eliza.

 

Segundo a diretora, Nayara se revelou uma líder nata. “A forma como ela sobe na mesa, conversa com os estudantes, enfrenta policiais e discute com vereadores deixava claro que se tratava de uma novíssima liderança. Ela se impôs ao filme.”

 

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