Para Ziraldo, em qualquer seleção dos dois melhores cartunistas brasileiros, um deles será Henfil. Jaguar diz só ter conhecido dois gênios na vida: Garrincha e Henfil. Aos elogios dos colegas, pode-se somar a importância histórica que o artista teve na luta contra o regime militar.
“Henfil Brasil”, que começa hoje no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio, é a primeira grande exposição sobre o artista desde sua morte, em 1988, aos 43 anos, de Aids, contraída em uma transfusão de sangue. E uma grande chance para pôr à prova a vigência de sua obra, sempre associada ao período da ditadura.
“A obra de Henfil é de uma atualidade impressionante. Quando revemos a maioria de seus cartuns, parece que foram concebidos ontem. Problemas que abordava continuam sem solução, numa espécie de tragédia permanente da vida brasileira”, diz Dênis de Moraes, autor da biografia “O Rebelde do Traço – A Vida de Henfil”.
Por muitos anos, Ivan Cosenza de Souza, único filho de Henfil, constatou que nem todos pensavam como Moraes. Ouviu muitos “nãos” de jornais, que rejeitavam publicar as tiras de seu pai porque elas estariam “fora de contexto”. As exposições que conseguia fazer eram pequenas, em lugares e eventos pequenos.
Hoje, as tiras estão saindo em três jornais de grande tiragem, foram editados cinco livros reunindo seus desenhos, e a obra despertou o interesse do CCBB.
“Essa exposição não é a realização de um objetivo, mas o primeiro passo. A obra precisa ser catalogada, restaurada, posta na internet. O que está mostrado aqui é só 3% do que tenho”, afirma Cosenza, 35, que montou a exposição com a produtora Julia Peregrino e o crítico Paulo Sérgio Duarte.
A mostra conta com 500 peças (uma página de quadrinhos é uma peça, por exemplo) e tem como foco principal personagens criados por Henfil: a Turma da Caatinga, com Graúna, Zeferino e Bode Orelana; os Fradinhos; Ubaldo, o paranóico; Urubu, torcedor-símbolo do Flamengo; e Cabôco Mamadô, aquele que enterrava os que não se posicionavam contra o regime militar.
Um dos “enterros” mais polêmicos está na mostra: o de Elis Regina, chamada por Henfil de “Elis Regente” por ter cantado nas Olimpíadas do Exército. Depois ele soube que ela fora coagida e pediu desculpas. E Elis cantou o hino da anistia, “O Bêbado e a Equilibrista” (João Bosco/Aldir Blanc), que pedia “a volta do irmão do Henfil” (o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho).
Blanc considera a “comovente autocrítica” de Henfil no caso um momento fundamental “de um humorista que era também homem com H maiúsculo”.
“O aguerrido e intimorato Henfil, que aparecia com suas armas de Quixote nos jornais, era o mais doce dos homens”, destaca Blanc. “Era um radical no melhor sentido: um homem de princípios éticos e convicções sólidos”, completa Dênis de Moraes.
Na exposição fica clara essa capacidade de Henrique de Souza Filho de unir nos desenhos delicadeza, raiva (contra injustiças sociais) e liberdade criativa à prova de patrulhas politicamente corretas -o fradinho Baixim mata crianças, por exemplo. Fica clara, portanto, a falta que ele faz.
——————————————————————————–
Henfil do Brasil
Quando: de hoje a 26/6 (a partir de 11/7, no CCBB-DF; a partir de 19/10, no CCBB-SP); de ter. a dom., das 10h às 18h
Onde: CCBB-RJ (r. 1º de Março, 66, tel. 0/xx/21/3808-2010)
Quanto: entrada franca