Evangélicos de escola de música de universidade do Rio se recusam a cantar Villa-Lobos

 

Músicas de Villa-Lobos são
executadas por orquestras
internacionais, mas enfrentam
resistência no Brasil
por motivo religioso

Pode parecer absurdo que alunos de música de uma universidade do país se recusem a tocar ou cantar músicas do genial compositor Heitor Villa-Lobos (1887-1959), mas isso está ocorrendo com frequência.

Andrea Adour, professora de Canto da Escola de Música da UFRJ, informa que alunos evangélicos que se recusam a cantar “Xango” [reprodução abaixo], de Villa-Lobos, porque acharem que se trata de uma reverência a um demônio de religiões de origem africanas.

A estupidez se manifesta com outros compositores, como Guerra Peixe (autor de “Toadas de Xangô”), Francisco Mignone (“Cânticos de Obaluayê”) e Waldemar Henrique (“Abalogun”).

A professora explica aos estudantes que a universidade é um espaço laico e, portanto, de diversidade cultural e que, ali, a música está vinculada à arte e não a qualquer prática religiosa.

Além do mais, é impossível estudar música do Brasil sem falar em Villa-Lobos e até entender as origens da cultura popular.

Nem sempre a professora convence os evangélicos, e alguns deles desistem do curso ou trancam matrícula.

Andrea é coordenadora do Africanias, um grupo de pesquisa sobre as influências negra e indígena no repertório brasileiro.

Ela diz que a recusa de alunos ao estudo de músicas com referência a religiões de afrodescendentes é um comportamento recente, mas em ascensão.

Valéria Matos, professora de Regência do Coral da UFRJ confirma: “É comum alunos de formação religiosa mais fechada questionarem, se recusarem a cantar, quando apresentamos alguma obra que usa termos de origem afro, referindo-se a entidades como Oxalá, Oxum”.

Para ela, o que está ocorrendo na escola de música é reflexo do atraso cultural que o Brasil vive no momento, o que serve de incentivo à intolerância religiosa.

Por isso mesmo, segundo ela, aumentou a responsabilidade da universidade em ensinar a diversidade aos estudantes.

Nem todos os estudantes evangélicos estão atrelados ao retrocesso cultural.

Paulo Maria, da Escola de Música, por exemplo, denuncia a existência de um racismo cultural.

“Cantar essas músicas não afeta minha religiosidade. Quando canto peças que se referem a religiões afrobrasileiras, canto como artista. Mas essa situação faz parte da História brasileira. O negro foi feito escravo, a cultura afro foi jogada de lado pelos europeus. Nossa formação histórica é essa”, diz.

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