No momento em que Convenção da Unesco pela Promoção e Proteção da Diversidade Cultural das Expressões Artísticas, aprovada em outubro do ano passado, em Paris, consagra a noção de cultura numa dimensão da economia mundial, não podemos deixar de refletir e conhecer sobre a situação das políticas culturais nos países da América Latina. Hoje a chamada economia das indústrias criativas, passa a ser vista como a vanguarda do desenvolvimento sócio-ecônomico global.
Sabemos que as negociações comerciais internacionais, do setor de agricultura ao setor de serviços, estão acontecendo entre blocos econômicos regionais. Desta forma, o desenvolvimento, o ntercâmbio, a cooperação e a co-produção entre os países da América Latina, como do Mercosul, é de suma importância para a consolidação de nosso mercado cultural.
No Brasil, apesar das políticas existentes, ainda encontramos um setor cultural deficitário de mecanismos e com diversas desigualdades nas diferentes cadeias das indústrias culturais. A situação não é diferente em muitos países latinos, que também não possuem políticas culturais direcionaspara sua promoção e desenvolvimento e até mesmo a figura de um Ministério da Cultura, que trate disto.
No caso da Bolívia, por exemplo, país de uma cultura mística- indígena, de diferentes idiomas, inexistem leis para defesa da cultura, radiodifusão e patrimônio. Encontramos uma situação de verdadeira indigência cultural. Os segmentos culturais, pleiteiam, em um documento desde 1997, a criação do Ministério das Culturas e Comunicação Social, absorvendo o hoje Vice-Ministério da Cultural, para criação de fundos de fomento, programas de difusão e outros mecanismo.
Já no Chile, como no Brasil e na Argentina, temos um painel mais desenvolvido. O setor cultural, em conjunto com o Ministério da Cultura chileno, organizou, no ano passado, um plano chamado “Chile quer mais Cultura 2005-2010”. Entre as ações defendidas está a duplicação do orçamento do Ministério, a criação do Instituto do Patrimônio e a implantação de um Plano de Fomento à Leitura. A criação deste documento, consolida um novo desenho, que já conta com uma estrutura administrativa em âmbito nacional e organismos representativos, como: o Conselho do Livro e da Leitura, o Conselho da Arte e da Indústria Audiovisual e o Conselho de Fomento à Música Nacional.
O Equador, ao contrário dos seus vizinhos, possui poucos organismos que promovam ou fomentem a criação cultural independente. O desenvolvimento cultural no país concentrou-se basicamente em duas leis: Lei da Defesa do Patrimônio Cultural e Lei da Criação da Casa de Cultura. Existem outrasinstâncias oficiais para a promoção e criação de políticas culturais públicas, mas seu espaço de ação é reduzido. Por exemplo, a Sub-secretaria de Cultura é um escritório dependente do Ministério da Educação e a sua direção corresponde às necessidades políticas conjunturais, porém, não correspondem a formulações técnicas a longo prazo. O Conselho Nacional de Cultura, outra entidade oficial, que deveria funcionar, como um sistema bancário de primeira necessidade para o fomento e ajuda econômica para projetos culturais, possui um financiamento reduzido, onde a entrega de subsídios é mínima e sua atividade centra-se na efetivação de empréstimos com taxas de juros similares às dos bancos privados. Atualmente se discute, em diferentes instâncias não-governamentais, a criação de um Conselho Nacional de Cinema e sua respectiva Lei de Fomento Cinematográfico.
No Paraguai, infelizmente, o fim da ditadura ainda não teve reflexos em diversas áreas e, principalmente, no setor cultural. Existe um vice-ministério da Cultura, vinculado ao Ministério da Educação, sem um orçamento específico. No Fundo Nacional de Cultura e Artes do Senado é onde se canalizam os subsídios aos projetos culturais. O diagnóstico que temos do país e de quase inexistência de políticas culturais. Assim, a comunidade artística trabalha pela regulamentação de leis para cultura, como Leis de Incentivos Fiscais, seguridade social para trabalhadores da cultura, definição de campos de ação e obrigações dos organismos estatais e a criação de mecanismos jurídicos entre o Plano de Estado de Educação e o Plano de Estado da Cultura.
Os agentes culturais do Peru e da Colômbia, com mecanismos para a cultura já mais consolidados, trabalham hoje no sentido de implementar em seus países, um conjunto de propostas que defendam e promovam as suas diversidades de manifestações culturais, como parte do grande processo de re-criação da identidade cultural dos países andinos. Tomando como exemplo o Chile, estes países pretendem conquistar uma reserva cultural dentro das negociações do Tratado de Livre Comércio (TLC) com os Estados Unidos. Isto porque, estes tratados, trazem como conseqüência, que se eliminem todas as medidas de proteção e subsídios no âmbito da cultura.
Também no Uruguai a questão cultural adquiriu relevância econômica. Um estudo foi contratado pela Universidade da República para analisar o setor. Uma das principais constatações foi que o complexo cultural do Uruguai é fortemente importador. Algumas problemáticas do setor cultural uruguaio foram detectadas. Entre elas, podemos dizer que fazem parte também do cenário cultural de todos os países latinos, como: fator de escala; insuficiência de difusão das criações nacionais, em grande parte devido às estratégias dos meios de comunicação de massa; oligopólios na distribuição internacional; carência de financiamento específico para produção de projetos; insuficiência na produção de propriedade intelectual; falta de capacitação empresarial e de gestão de agentes culturais; inexistência de verdadeiras políticas culturais do Estado.
Como vemos temos muitas afinidades com países da América Latina pela necessidade de criação e aprimoramento de políticas culturais para os setores como um todo. Claro que estas políticas culturais que foram apontadas, não obedecem a um simples esquema burocrático de informações. >Elas são muito mais amplas do que isto. Fazem parte inicialmente de um movimento cultural histórico da classe pelo seu desenvolvimento. Agregam, hoje, grupos como da radiodifusão, intervindo nestes processos de formulação de políticas culturais, para que seus interesses econômicos sejam mantidos e atendidos. Uma gama de condicionantes rondam estas políticas.
Sendo assim, além de buscarmos e trocarmos, cada vez mais, este tipo de informações e ntensificarmos nossa integração latina devemos é estar muito atentos, para que este ganha-pão com a cultura, não se transforme numa economia que não contemple a diversidade das diferentes manifestações artísticas.
(*) Débora Peters, 33 anos, cineasta, produtora, Coordenadora Geral de Projetos da Fundacine, atua no Comitê Diretivo da Coalizão Brasileira pela Diversidade Cultural e como Vice-presidente da ABD Nacional.