Carnaval de rua promove o samba para milhões de foliões

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“Quem não chora não mama! / Segura, meu bem, a chupeta / Lugar quente é na cama / Ou então no Bola Preta / Vem pro Bola, meu bem / Com alegria infernal! / Todos são de coração!”. A marchinha, criada por Nelson Barbosa e Vicente Paiva, inicia as atividades do quase centenário bloco de rua carioca Cordão do Bola Preta. A folia é tanta e tamanha que rende uma disputa, com o bloco pernambucano Galo da Madrugada, pelo título de “o maior bloco de carnaval do mundo”. Ambos já conseguiram juntar, cada um, mais de 2,5 milhões de pessoas para brincar o carnaval gratuito nas ruas.

 

Mas nem só de blocos tradicionais em locais consolidados vive o carnaval de rua. Números excepcionais vem sendo registrados em estados como São Paulo, que contabilizou este ano o maior carnaval da sua história: as ruas foram tomadas por 355 blocos, seguidos por cerca de 2 milhões de pessoas. Pesquisadores e investigadores de cultura popular têm acompanhado um movimento de retomada e valorização do carnaval de rua, sem necessidade de abadá ou inscrição, após um período em que a ascensão das escolas de samba dividiu foliões entre a grandiosidade dos desfiles e o despojamento das ruas.

 

“Nos anos 1980, o carnaval de rua regrediu. Ficou muito concentrado nas escolas de samba, que começou a atrair a atenção do Brasil todo. A classe média começou a viajar. Teve 20 anos que parou e voltou com toda a força. Hoje, os jovens das classes média e alta não querem mais viajar no carnaval. Juntam eles com os setores populares e o festejam de forma espontânea, na rua. A cidade volta a ser do povo e povo brinca o carnaval”, avalia a historiadora Rosa Maria Araújo, que preside o MIS (Museu da Imagem e do Som).

Ranchos, cordões, blocos e ‘grandes sociedades’

 

O ato de extravasar e usar o espaço público para curtir o carnaval no Brasil não é recente. Desde o século 19, há registros dessas manifestações. Já as formas de brincar eram mais segmentadas, de acordo com a classe social da população que se manifestava por meio de ranchos, cordões, blocos e ‘grandes sociedades’. Os primeiros cordões e, em seguida, os ranchos, são tipos de cortejo que foram da Bahia para Rio de Janeiro, com a mudança da capital federal.

 

“O rancho era um tipo de desfile que surge no fim do século 19, uma versão equipada dos cordões.  Os cordões são de um pouco antes de 1880. São um grupo de rua com uma corda em volta. Contavam com percussão e gente cantando. Os ranchos já tinham instrumentos como violão, cavaquinho, flauta e clarinete”, explica Pedro Paula Malta, músico e pesquisador da Fundação Nacional de Artes (Funarte), entidade vinculada ao Ministério da Cultura.

 

De acordo com Malta, pessoas de baixa renda frequentavam os ranchos, que desfilavam, inclusive, com animais. “Eles tinham um estandarte. Figuras como porta-bandeira e mestre-sala vêm desta época. Se formavam em torno de alguma fábrica, geralmente de tecido, a exemplo dos bairros cariocas: Jardim Botânico, Laranjeiras e Vila Isabel. A folia era ir para rua mascarados, fantasiados de velho, palhaço e rei”, emenda.

 

Em paralelo, os mais abastados se agrupavam em outro tipo de agremiação, as chamadas “grandes sociedades”, que faziam desfiles de rua em carros. “Era um jeito de fazer critica à política, à sociedade. Cada uma delas tinha os seus artesãos. Os menos favorecidos iam para a rua para ver. As principais eram Os Democráticos, Os Tenentes do Diabo e Os Fenianos. Duraram até os anos 1920 ou 1930. Os desfiles das escolas de samba pegaram elementos de um e do outro”, afirma.

 

Para a classe média e a elite, havia ainda os bailes de Carnaval, realizados em salões, cujos primeiros registros datam de 1840.  Anterior a essas manifestações, havia a “zoeira de rua” ainda mais agressiva, o entrudo, quando grupos de escravos e trabalhadores mais pobres iam para as ruas mascarados e jogavam entre si farinha, café e bolinhas com líquidos dentro. O conteúdo das bolinhas iam de água de cheiro a urina.

 

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