Um dos mais importantes eventos do mundo da dança escolheu como diretor um brasileiro ousado, capaz de abraçar ao mesmo tempo a burka islâmica e a tanga indígena, para oferecer um amplo retrato do corpo nos dias de hoje.
Na edição deste ano da Bienal de Veneza, intitulada Body Attack (Ataque Corporal), o coreógrafo e dançarino brasileiro Isamael Ivo quer dar diferentes amostras de como distintas culturas lidam com o corpo. O coreógrafo visa mostrar como o corpo pode ser um instrumento político, uma arma capaz de resistir à opressão.
“O que acontece com o corpo? Por que em algumas sociedades ele é coberto, é reprimido?”, pergunta o coreógrafo brasileiro. As respostas devem ser dadas por artistas de 14 companhias de Cuba, Irã, Canadá, Itália, China, Japão, Estados Unidos e Costa do Marfim.
Do Chile vem o Balé de Santiago, dirigido pela brasileira Márcia Haydée, que apresenta um espetáculo inspirado no poema Cuerpos Pintados, de Pablo Neruda.
Ivo recebeu com surpresa o convite para assumir o cargo de diretor de uma das mais importantes instituições européias no território da cultura.
A Bienal de Veneza é mais conhecida pela exposição de artes, mas também abriga teatro, música e dança.
“A Bienal não é um supermercado de arte. Ela é um centro no qual você respira arte e participa de novas visões artísticas, Foi isso que tentei fazer dentro do programa de dança. Quero fazer dela um espelho que reflita a linguagem do corpo na atualidade e a projete no futuro”, disse o coreógrafo.
O Brasil está diretamente representado por uma coreografia criada por Ivo, que se inspirou na novela A Incrível e Triste História da Cândida Erêndira e sua Avó Desalmada, do escritor colombiano Gabriel García Márquez, e pelo “ritual do fogo” de uma tribo de índios xavantes do Mato Grosso.
O evento é o único a ocorrer em céu aberto, às margens dos canais de Veneza, e promete ser um dos pontos altos do festival.
Um dos espetáculos que promete ser dos mais contundentes do evento vem do Irã. Letters from Tentland foi concebido pela coreógrafa alemã Helena Waldmann e a dramaturga Susanne Vincez.
Elas levaram para o palco seis bailarinas iranianas, que se movem dentro de tendas que revelam acontecimentos violentos. No espetáculo, as mulheres, nos dizeres de Ivo, se “despem” da sua religiosidade e “soltam os burros”.
Ismael Ivo nasceu na periferia de São Paulo. Ele ganhou uma bolsa de estudos para estagiar com a companhia do coreógrafo Alvin Ailey, em Nova York, e em 1985 mudou-se para a Alemanha, onde vive até hoje.
Na Bienal de Veneza, Ivo participou diretamente da criação das coreografias das companhias convidadas.
Dessa maneira, conseguiu incluir na programação um grande número de espetáculos inéditos. “Antes que os coreógrafos começassem a realizar ensaios, fui até eles. Pesquisei e descobri artistas que estavam buscando algo novo hoje e nos unimos num trabalho conjunto. Estabelecemos um diálogo muito interessante.”
O Festival Internacional de Dança Contemporânea começou neste sábado e vai até 2 de julho.