Artista, siga o lado oposto ao da Regina Duarte

 

Como músico, se eu também pudesse dar um conselho para os artistas brasileiros, diria: “caminhem sempre do lado oposto ao da Regina Duarte“. Não há conduta mais prejudicial a uma classe que é a primeira a ser bombardeada quando um governo de Direita assume o poder. Claro, a cultura, assim como a Educação, são elementos emancipadores. Portanto, dotar uma sociedade de educação e cultura significa oferecer criticidade, liberdade e um revestimento forte contra intenções de encabresto.

 

O que estranha é a militância incansável da atriz contra tudo isso, desde os tempos em que disse “ter medo” de um provável governo popular. O “temeroso” governo que ela esperava veio em seguida. Lula e Dilma emplacaram não apenas a cultura como ministério forte e autônomo, mas amplificaram a voz dos artistas, sejam do cordel ao cinema, a partir da condução de ministros da naipe de Gilberto Gil, Juca de Oliveira e Ana de Hollanda.

 

Uma representação incrível, nem de longe comparada com os protagonistas do golpe que entronizaram o Sérgio Sá Leitão após a polêmica se o ministério deveria ou não ser extinto. E nem de longe comparada com o projeto do Bolsonaro, a continuidade do golpe com verniz de democracia, cuja aberração será citada mais adiante.

 

Regina Duarte é atriz, porém se comporta como uma ativista anticultura. Sua entrevista à Folha de S.Paulo desta sexta-feira (30), curta e vazia, passeia no abstrato e em ideais vagas que lembram aqueles discursos à la “We are the World”.

 

Ela diz, sem nenhuma profundidade ou sugestão, que “tem convicção de que, assim como em outras áreas, ele (o Bolsonaro) vai dar melhores rumos para o país e acho que na cultura também”. E acrescenta, “se se chama Lei Rouanet ou não, se é ministério ou secretaria, não importa. Importante é que a cultura brasileira é pujante”. Para quê política cultural, né?

 

Ela se colocou à disposição na condição de “palpiteira” do futuro governo. Ousou até a elogiar a provável transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém (“Acho que demorou, como fala a garotada”, diz, em sua observação geopolítica).

 

O governo que a atriz enaltece já dá sinais claros — como vimos com o ministro da Educação Ricardo Vélez, que não vê necessidade de uma universidade ampla para todos, já que existem jovens que se tornaram youtubers e, assim, ganharem dinheiro — de que a cultura será relegada ao último item da lista de prioridades do Ministério da Cidadania, que abrigará ainda os setores de Desenvolvimento Social e Esporte.

 

Por sinal, este ministério será conduzido por Osmar Terra (MDB) que já foi logo adiantando. Não entende bulhufas de cultura e que sua única experiência com a área foi porque um dia “tocou berimbau”. Desse governo e dessas figuras Regina Duarte não mostrou até agora qualquer surpresa ou temor.

 

Dos foliões globais inesquecíveis que foram à micareta com o abadá do “Morobloco”, que contribuíram para ferir a frágil e estuprada democracia brasileira, derrubou uma presidente honesta e com comprometimento real com os artistas, ao estado de golpe que veio em seguida até a escalada fascista anti-ciência, anti-cultura e anti-intelectualismo que estamos vivendo, o setor artístico foi o primeiro a ser atingido. Bem na aorta. Vai morrer abraçado com a Educação, ao estilo Tele Curso do governo Bolsonaro.

 

Já não haverá ministério, nem artistas de grande respeito e sensibilidade no comando. Somente uma salinha no fundo do prédio na Esplanada, com um tocador de berimbau frustrado e Regina Duarte com seus palpites.

 

Artistas, esperem apenas o que lhes restam: as migalhas. Sad but true. Público, inebriem-se com a Viúva Porcina, que agora faz festa por um Brasil que neutralizou as artes, a manifestação cultural, como o fogo que reduziu o Museu Nacional a cinzas.

WILLIAM ROBSON CORDEIRO

Jornalista, músico e professor. Mestre em Estudos da Mídia (UFRN) e doutorando em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com estágio na Universitat Autònoma de Barcelona (UAB)

 

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