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Ariano Suassuna:

“Eu acredito na cultura popular”

 

O romancista e teatrólogo Ariano Suassuna nasceu na cidade paraibana de Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, em 16 de junho de 1927. Em 3 de agosto de 1989 para eleito para a Cadeira nº. 32 da Academia Brasileira de Letras. Formou-se em Direito na Faculdade de Direito do Recife, da Universidade Federal de Pernambuco, mas em 1956 deixou a advocacia para tornar-se professor de Estética dessa universidade. Suas obras são marcadas pela valorização da autêntica cultura nordestina. Exemplo claro é a forte presença da literatura de cordel nos seus livros e peças teatrais. Destacam-se O Auto da Compadecida (1955), peça encenada em nove línguas; e A Farsa da Boa Preguiça (1960, publicada em 1973), considerada por ele sua melhor obra.

            No dia 22 de outubro passado, Ariano participou da IX Semana Universitária da Universidade Estadual do Ceará, quando fez palestra para mais de mil estudantes, professores e servidores. Enaltecendo o povo brasileiro, suas tradições e costumes, em sua exposição repudiou a intervenção estrangeira na nossa cultura, particularmente a utilização, cada vez mais constante, de palavras em inglês. Sempre irônico e bem-humorado, afirmou: “Um dia me chamaram para palestrar num colégio, e, quando cheguei lá, na entrada tinha uma faixa onde estava  escrito: Ato show com Ariano Suassuna. Eu disse logo: ‘Só entro se tirarem isso daí. O que conheço de show é uma interjeição utilizada na minha terra para espantar galinhas’”.

           

 

 Muitos poetas, cantores e compositores populares viveram durante toda sua vida na miséria. Alguns deles morreram de fome ou doença dela decorrente. Por que, em nosso país, existe tanto descaso com os principais atores da cultura popular?

 

Ariano Suassuna – Isso é resultado de uma injustiça que existe na própria sociedade brasileira. Quer dizer, não são somente os poetas populares que são injustiçados, mas todo o povo do Brasil real. No momento em que os portugueses desceram aqui, começou essa secular injustiça social. Quando Cabral se sentou numa cadeira acompanhado de seus capitães e chegaram dois índios pra falar com eles, nesse momento esses índios representavam a semente do povo brasileiro – e começou aí essa injustiça social. Nós, brasileiros privilegiados, somos descendentes de Cabral e dos outros portugueses da classe dele. Mas também o povo brasileiro descende dos índios, negros e portugueses pobres e, depois, de outros europeus e asiáticos pobres que vieram ao nosso país. Então, essas injustiças acabam atingindo toda a sociedade brasileira, e os poetas populares já são injustiçados até em relação aos outros. Agora, essa marginalidade também é um pouco dos escritores, sejam eles quais forem. E, quando se trata de um artista popular, é maior ainda.

 

 A cultura popular resiste bastante no nosso país. Poderíamos dizer que ela, particularmente a do Nordeste, é como o sertanejo de Euclides de Cunha, “ antes de tudo,  um forte”?

 

Ariano – Exatamente. Ela tem demonstrado uma capacidade de resistência muito grande. Apesar de todo o descaso e, às vezes, perseguição, ela continua a existir e persistir no nosso país. Eu acredito que a cultura popular dá a todos nós um grande exemplo, e temos que aprender muito ainda com ela.

 

 Que mensagem você enviaria aos escritores que estão começando ou mesmo àqueles que ainda estão relutantes em entrar no mundo da literatura?

 

Ariano – Olhe, eu não teria muita coisa a dizer a eles, não. Mas acho que pelo menos eu diria, porque foi assim que aconteceu comigo, que lessem muito. Porque a leitura pra mim foi fundamental. Foi a leitura que me abriu o mundo. Eu nunca saí do Brasil, mas eu conheço a Rússia como muitos russos não conhecem. Nem é todo português que conhece Portugal como eu. Tudo isso por causa da leitura. Quer dizer, eu não fui à Rússia, mas li com muita atenção e muita paixão Gogol, Dostoievski, Tolstoi, que me fizeram conhecer muito aquele país. Por isso, o conselho que dou é que leiam muito mesmo.

 

 

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