A Cabanagem e a história, como fato e como vida real

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Acaba de ser lançado um livro que todos – militantes, intelectuais, estudantes, alunos e professores – precisam ler: Nova história da Cabanagem, de Sérgio Buarque de Gusmão.

A Cabanagem – levante popular que conflagrou o Grão-Pará na segunda metade da década de 1830 – é um episódio da história da luta popular no Brasil envolvido em inúmeros mitos. E que são agora enfrentados em Nova História da Cabanagem – seis teses revisam a insurreição que incendiou o Grão-Pará em 1835, de autoria do jornalista e historiador Sérgio Buarque de Gusmão.

 

O livro, que acaba de ser lançado, examina em profundidade a bibliografia existente (que já é farta, embora repetitiva) sobre a Cabanagem, e compara suas informações com documentos existentes nos arquivos públicos do Pará.

 

A larga experiência jornalística do autor é visível na linguagem clara e direta que o livro revela. Não há exercícios retóricos ou metodológicos mas a intenção de comunicar aos leitores as ideias nele discutidas, sem qualquer artificialismo. E sem deixar de lado o necessário rigor científico que uma empreitada dessa natureza exige.

 

Esse rigor que une as atividades do historiador e do jornalista é o firme e constante respeito ao fato –acontecido no presente ou no passado longínquo mas documentados da forma mais precisa possível. “Convém ponderar que História (e Jornalismo, o ofício do autor) dependem do fato”, diz Sérgio na Nota do autor que abre o livro. “A interpretação é essencial para dar sentido contextualizado ao fato, expressão que dá visibilidade ao acontecimento”. Mas ela, insiste, “ainda que oxigenada por teorias e métodos mais elucidativos, é escrava do fato”.

 

cabanagem_livro100413Com base nesse rigor factual, ele desmonta inúmeros mitos e interpretações subjetivas daquele acontecimento histórico central não apenas para a história da Amazônia mas sobretudo brasileira dadas as contradições que enfrentou há quase dois séculos.

 

Um desses mitos diz respeito ao número de mortos repetido à exaustão pela historiografia, que fala em 30.000 a 40.000. A rebelião, e a repressão contra ela, foram sanguinárias e cruéis, não pode haver dúvida. Mas o exame da documentação e da bibliografia, a soma das perdas em batalhas e confrontos, não autoriza aquele número que, assegura Sérgio, “é fruto de exercício da arte divinatória”.

 

Há ainda a consideração do caráter daquela luta. Motim, revolta, revolução, levante – estas foram algumas das maneiras tradicionalmente usadas para definir a Cabanagem. Muitos disseram que houve desorientação entre os cabanos, que não teriam um programa. Tiveram; foi “o das lideranças, executado a ferro e fogo”, diz ele.

 

Sérgio Buarque de Gusmão mostra que o programa da insurreição popular – que envolveu desde grandes fazendeiros até índios, negros e o povo pobre – pode ser definido como democrático (era contra o despotismo vigente) e de libertação nacional (defendia a independência, contra o domínio português, e rejeitou influências estrangeiras).

 

A história da luta popular, democrática e nacional no Brasil precisa estar baseada nos fatos para que as interpretações que inspiram tenha efetividade nos enfrentamentos cotidianos do presente. Esta talvez seja a grande lição que Sérgio Buarque extrai dos acontecimentos ocorridos no Grão Pará. A amplitude daquela luta foi extensa – vai desde os enfrentamentos pela Independência, em 1822-1823, até a derrota final e sangrenta da Cabanagem, no final da década de 1840. E foi uma luta cujo programa não pode ficar preso aos sonhos e fantasias de seus intérpretes atuais – por mais bem intencionados que sejam. A verdade é revolucionária – este é um truísmo muito repetido. E. quando se conta a história, a verdade precisa estar amparada rigorosamente nos fatos. Apenas sendo assim é que a atividade de contar a história faz com que a história que realmente acontece entre os homens caminhe para frente.

Leia o prefácio da obra em documento PDF anexo ao texto.

Download Prefácio Nova Historia da Cabanagem

 

Do Portal Vermelho

 

Por José Carlos Ruy

 

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