O jornalista e compositor Cláudio Ribeiro passeia com desenvoltura por um encontro que vira cronica que vira poesia. Rasgando a memória de nossos tempos míopes, o aqui cronista Cláudio, rememora poeticamente o encontro casual com a grande Helena Kolodi, mostrando que o verdadeiro encontro com o outro, é o encontro com uma face que nos contempla e mais do que qualquer coisa, com a face que nos reconhece, como humanos, ora sujeitos a tristezas e algumas vezes chegam de mansinho, sem nem mesmo avisar.
“Ao meu amigo Cláudio Ribeiro
que viaja sonhando nos roteiros da poesia,
a minha carinhosa saudação!
Helena Kolodi”.
Naquele fim de tarde eu andava um pouco às tontas. Percorria a Rua XV, sem pensar em percorrer meus caminhos de menino. Não! Aquela não era a Rua XV dos meus tempos de matinês, em que eu e meu pai riamos, com os desenhos animados. Não, não era aquela da Confeitaria das Famílias, em que me cansara de lambuzar boca e alma com seus doces. E nem mesmo se tratava da Rua XV do saudoso Bar Cometa.
Quem sabe, eu estivesse machucado demais para ao menos, tentar relembrar aquilo tudo. Mas, mais do que isso, talvez, naquele momento eu fosse todo o cansaço acumulado das varias vezes que por ali passei, freqüentemente premido pelo tempo e sempre inclinado por circunstancias varias, a acertar as contas, seja com o relógio de pulso ou com o gerente do banco ou com a minha própria vida.
Sem nenhuma raiva e tão pouco, nenhum desejo, eu ia navegando por aquele leito, seguindo o curso que faz com que a Rua XV, deságüe naquela, que dizem ser a menor avenida do mundo, Luiz Xavier, avenida aonde num final de tarde, tudo parece caber, desde a rapidez dos dias modernos, até agitação da rua e toda confusão da vida. Talvez naquele momento, eu me sentisse desorientado como um barco perdido, carregado pela maré da vida.
Cada um dos meus passos, deixava para traz um rastro das memórias, dos dias vividos, de alma na mão e de nervos à flor da pele.
Sentia-me com se estivesse sendo tragado. E assim foi…
Assim foi até…
Até o momento que eu a encontrei. Dali pra diante, meus ouvidos começaram a ouvir um som de vento, que agitando às arvores iam roçando carinhosamente as flores. Enquanto meus olhos, embevecidos, eram testemunhas das pessoas que passavam cantando ao sol que se punha no horizonte.
Jamais passara por minha cabeça, que seria dali, daquele local e justamente naquele dia, que eu deslumbraria um fim de tarde como aquele, com sua tonalidade rósea e que tão preguiçoso como a vida, descia lentamente…
-
Cláudio???!!!
Mais do que uma pergunta, aquela era uma afirmação, como num passe de magica, brecar no mesmo instante, qualquer pendência, qualquer injustiça ou ferida que eu trouxesse escavada junto a mim.
Com a minha voz tremula, digo logo…
-
Sim, sim sou eu, Cláudio.
E ela, com aquele par de olhos azuis, que emitem sonhos de luz, não demorou a dizer:
-
Que prazer encontrar você. Você esta mais gordinho. Mas, mais bonitão!
Mas, logo depois, por obra de um instante que tem por finalidade turvar um instante único, ela foi se perdendo aos poucos para ceder lugar ao trafico de fim de tarde.
Mas tarde, depois de ter visto meu rosto no espelho, comecei a refazer, na minha cabeça, todo o percurso daquela tarde, e percebi que aquele acontecimento, talvez jamais tivesse tido qualquer conseqüência e nem teria sido uma revelação angelical, caso não tivesse sido o encontro casual com aquela figura de mulher, que me fitou, e abriu seu sorriso embriagador.
Sua boca fresca, com seus lábios perfeitamente desenhados, ao se mover parecia estar disposta a dizer alguma coisa. E de fato disse, que afinal, fez toda a diferença.
-
“Súbito silencio, palavras inesperadas geram decisões. Um encontro ocasional, altera todo um destino”.
E foi assim, que eu pude entender todo o encantamento, parte nascido daquele fato.
O verdadeiro encontro com o outro, é o encontro com uma face que nos contempla e mais do que qualquer coisa, com a face que nos reconhece, como humanos, ora sujeitos a tristezas e as injustiças que nos ferem à alma, ora sujeitos também às alegrias e as delicias da vida, que algumas vezes chegam de mansinho, sem nem mesmo avisar…
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“Arco-íris no céu. Esta sorrindo o menino que apouco chorou”.
Há certos momentos que a solidão, nos atravessa como uma lança. E é só no encontro com o outro, que um barco, arrastado a mercê da tempestade, sem bússola, nem leme, encontra sua estrela de orientação.
Eis a dadiva do verdadeiro encontro.
No dia seguinte, ao despertar no meio do mar sereno, ouvi em canto a dizer, em meio as flores um nome: Helena Kolodi!!!
– “Um sabiá cantou! Longe daqui dançou o arvoredo Choveram saudades. Caem as folhas. De repente, brotam outras pelos ramos. Murcham flores, surgem gomos. E a planta, volta a semente. Assim somos, subtilmente diferimos do que fomos. Impossível transmitir , por secreto e singular, o acrescentar e perder deste crescer que é mudar”.
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