Sopa é um alimento líquido ou pastoso, umas vezes feita somente de pão e água, outras com cereais e, ainda, hortaliças e carne de diversos tipos. Presente na alimentação humana desde que o homem pré-histórico encontrou um meio de aquecer a água para cozer alimentos – a sopa foi, provavelmente, a primeira comida elaborada e criativa da História, já que resulta da mistura de ingredientes e estes são praticamente infindáveis. Afinal, diz a lenda, que, havendo água, até de pedra se pode fazer uma sopa.
La Bouillabaisse
Bouillabaisse é um prato típico da culinária francesa, originário da cidade portuária de Marseille e comum na região do Mediterrâneo. Consiste de uma sopa ou guisado preparado à base de peixes brancos sortidos, filetes de peixe, vegetais e ervas aromáticas. Trata-se, na verdade, de dois pratos: uma sopa, em que se serve o caldo sobre fatias duras de pão de véspera; e um prato de peixe e vegetais.
Diz a lenda que Vênus, a deusa da beleza, serviu bouillabaisse a seu marido, Vulcano, para colocá-lo para dormir enquanto tinha um encontro amoroso com Marte.
Escritores gregos argumentam que cerca de 600 AC os fundadores de Marselha levaram consigo da Grécia a receita de uma sopa de peixe conhecida como kakavia que serviu de base para a futura bouillabaisse. Outros textos medievais fazem menção a cosidos de peixe em água e, ou azeite e vinho, porem até o presente não se conseguiu apurar com precisão a origem definitiva do bouillabaisse atual. Adicionalmente sugere-se que a bouillabaisse nasceu entre os pescadores, ao redor do Vieux Port de Marseille, que, depois de separar os peixes para vender, faziam uma sopa para a família com os que sobravam. Com o tempo, o prato foi sendo aperfeiçoado. Hoje, os marselheses o degustam assim: primeiro, só o caldo do peixe, com roille (um molho picante à base de maionese, pimenta malagueta e alho); depois, os pedaços desossados dos vários peixes, mergulhados num pouco do caldo.
A mais diferenciada característica, no entanto, não é o peixe, porque sopas e cozidos possuem peixes, mas o aroma e o sabor original derivado das combinações de ingredientes transformam o bouillabaisse em algo especial. Um escritor de alimentos famoso, Jean-Noël Escudier chamou o bouillabaisse de “síntese mágica”, outro francês Curmonsky rotulou como “d’or soupe” ou a sopa de ouro.
Uma das sopas mais famosas do mundo, a bouillabaisse é uma experiência deliciosa, impossível, ou pelo menos desajuizado, é visitar o Sul da França e não prová-la, ainda que possa ser encontrada em qualquer local do mundo.
Com toda a sua simplicidade e rusticidade, a sopa nasceu quando o homem se deu conta que as carnes duras que caçava se amaciavam e adquiriam melhor sabor se cozidas com água e ervas. Quando ele bebeu desse caldo e se agradou dele, a sopa se incorporou à civilização para nunca mais sair. Recipientes de todas as espécies, do estômago de animais à sopeiras de ouro, testemunharam ao longo dos tempos o hábito ininterrupto, de todos os povos, de preparar e tomar sopas. Por ser um prato fácil e acessível, de considerável valor nutritivo e energético, os caldos e as sopas foram a base da nutrição de, praticamente, todas as civilizações.
A Bíblia nos conta que os hebreus, no Egito, preparavam suculentos caldos e, referindo-se a Gedeon, nos diz; “matou um cordeiro, pôs sua carne em uma panela e fez caldo”. Na Grécia, a sopa fazia sucesso. Em Atenas, a de lentilhas, em Esparta, o famoso “Caldo Negro” feito com sangue de alguns animais misturado com vinagre e especiarias (parece estranho, alguns autores dizem que era intragável, mas o frango ao molho pardo, aquele das Minas Gerais, também tem essa base). Na China, os camponeses se reconfortavam com sopas de arroz e favas. Roma teve uma grande tradição “sopeira”. Desde os seus primórdios os pastores tinham como prato principal e cotidiano uma sopa de farro (um grão típico da Itália, muito antigo, semelhante ao trigo mas de consistência mais dura) e grão de bico, que se acompanhava com outros produtos de época como verduras, legumes, frutas e queijos. A decadência de Roma coincide com o auge das sopas, que chegou a transformar-se num alimento de luxo.
Após a queda do Império Romano, a sopa sobreviveu ao Império Bizantino, cujo povo se regalava com sopas de peixes com legumes, muito nutritivas e açucaradas com mel em abundância.
Apogeu na Idade Média
No século 12, sopa designa um pedaço de pão sobre o qual se verte caldo fervente de carnes, legumes ou vinho, diretamente em travessas fundas de madeira, barro cozido ou estanho. Uma crônica da época, conta que os priores e abades foram os primeiros adeptos da iguaria, fazendo servir de 5 a 6 sopas distintas diariamente, além de ser o tema um assunto de animadas conversas e discussões
Durante a Idade Média, as sopas, de fato, ganham notoriedade, não só nas abadias e mosteiros. A medicina reconhece suas virtudes terapêuticas e passa a prescrevê-la como remédio, sendo o caldo de galinha o mais cotado, antes de qualquer outra.
Na mesa do pobre, ela era, de longe, o alimento complementar mais importante. De ovos, favas, abóbora, alcachofra, alho-porro, ervilha, couve, rabanete e outras hortaliças, em geral selvagens, era ela que, de manhã e de noite, ajudava a engolir o pão duro e escuro dos camponeses, este, o principal elemento da alimentação popular. O caldo dessa sopa era, quase sempre, temperado com cebolas e dentes de alho e aromatizado com diversas ervas; sempre que possível, um pedaço de carne, em geral de porco, salgado, temperado com gordura, manteiga ou óleo.
Foi, ainda, a essa altura, que as sopas começaram a aparecer no repertório culinário da nobreza européia, mas, diferentemente da sopa dos pobres, os caldos eram fartos em carnes e condimentados com muitas especiarias. Eram comuns as sopas agridoces, nas quais usava-se mel e, mais tarde, açúcar. Também era costume colorir as sopas: açafrão para ficarem amarelas, leite de amêndoas para ficarem brancas.
Tempos Modernos
De arquétipo das virtudes campesinas e posterior emblema da calma felicidade burguesa, a sopa adentra a era moderna sofisticando-se. A partir do século 16, as cozinhas italiana e francesa deram o seu “toque de classe” à arte de prepará-las. A primeira introduziu a novidade das massas e ervas aromáticas como o tomilho, os orégãos e a manjerona. Na França, os cozinheiros davam o seu melhor: crèmes, bouillons, veloutés, consommés…, batizando as suas invenções com nomes de reis.
No século 17, Louis 13, rei da França, saboreava, diariamente, dois grandes pratos de sopa. Entusiasmado com os legumes, mandou que se plantassem no Palácio de Versailles os mais delicados e deliciosos legumes e estes passaram a entrar nas inúmeras “potage de plaisirs” (sopa de prazeres) que se tornaram a última moda entre a aristocracia francesa. Isto estimulou os cozinheiros da época, entre eles, Françoise de la Varenne (1615-1678), que, sozinho, criou mais de 300 receitas diferentes.
Nas mãos dos mais célebres chefs franceses, as receitas reais se enriquecem e, no século 19, por toda a Europa, as sopas passam a abrir o menu dos jantares das boas mesas. Uma mesma refeição pode comportar de duas a cinco sopas diferentes: “A la Conti, A la Saint-Cloud, A la Dauphine, A la Pluche…”. Nesta época, o grande chef de cozinha Antoine Carême, atualizou as velhas fórmulas e legou à posteridade as bases das receitas que ainda hoje se servem nos restaurantes mais afamados do mundo inteiro.
Mais sofisticadas, com consistência mais leve, as sopas servidas como entrada têm por papel abrir o apetite a fim de fazer honra à abundância das refeições onde se sucedem, às vezes, mais de dez pratos. Paralelamente, a sopa guarda seu status de prato único e substancioso junto às famílias pobres, sobretudo dos camponeses.
A Sopa Tecnológica
O século 20 assistirá à evolução dos modos de alimentação, inseparáveis das transformações dos modos de vida humanos, mas a sopa continuou tendo relevante papel na dieta universal. Com a tecnologia, vieram as sopas prontas, em lata, desidratadas, congeladas, dos mais variados sabores, pra todos os gostos e bolsos. Algumas são realmente muito gostosas e, todas, inegavelmente práticas. Entretanto, numa noite de frio, quem resiste a uma sopinha caseira, feita com ingredientes naturais fresquinhos, impregnando a casa com seu perfume e fumegando na sopeira?
Sopas mais famosas do mundo
Alguns pratos são como o cartão de visita de um povo, porque fazem parte da sua cultura gastronômica e da sua História. Isso acontece de uma maneira muito especial com as sopas, que, em boa parte do mundo, são, tradicionalmente, o primeiro prato da refeição principal do dia. Veja algumas delas:
Do Brasil: Bambá de Couve (farinha de milho e couve), Caldo de Mocotó, Caldo de Feijão;De Portugal: a Canja (que, segundo alguns especialistas, terá vindo da Índia) e o Caldo Verde;
Da Espanha: o Gazpacho (com tomate, pepino, alho, pão e azeite, servida fria).
Da França: a Soupe à l’Oignon (a base de cebola) e a Bouillabaisse (a base de legumes com frutos do mar frescos), Bisque (cremosa, a base de frutos do mar);
Da Inglaterra: a Oxtail (sopa de rabo de boi);
Da Itália: o Minestrone (com feijão, massas e legumes,comumente feita com lingüiça);
Da China: a Sopa de Ninhos de Andorinha, Won Ton (caldo com bolinhos recheados de hortaliças e carne);
Do Japão: Missoshiro (caldo de peixe com missô)
Do Vietnã: Canh Chua (caldo aromatizado com hortelã e tamarindo com pedaços de peixe);
Da Tailândia: Tom Kha Gai (de leite de coco com frango, muito coentro e outros aromas);.
Da Rússia: o Bortsch (de beterraba frescas, servida quente ou fria);
Do México: Posole (com carne de porco ou frango, caldo e canjica);
Dos Estados Unidos: Vichyssoise (de batata e alho porro, servida fria); Clam Chowder (creme encorpado, quase em mingau a base de moluscos, batatas e leite)
De Cuba: Sopa de Frijoles com Calabaza, (de feijões com abóbora);
Do Haiti: Consommé a l’Orange (de caldo de frango, suco de laranja e cravo da índia)
Do Egito: Melokhia (a base de uma erva egípcia que dá nome à sopa e carne de cordeiro ou frango);
De Israel: Pumpkin Soup (de abóbora e caldo de frango).
Fontes:
Culinary History Cookbooks
Soupsong
História da Alimentação
Jean Louis Flaudin e Massimo Montanari
Wikipédia |
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