“Favela, pega a visão, não tem futuro sem partilha nem Messias de arma na mão”, diz trecho do samba; confira o samba e a letra completa.
Campeã do carnaval de 2019 contando a história não oficial do Brasil, a Estação Primeira de Mangueira se apresentará no Carnaval de 2020 com um samba crítico que exalta a figura solidária de Jesus Cristo e prega o olhar para os oprimidos. A canção que embalará o desfile assinado pelo carnavalesco Leandro Vieira é composta pela mesma autora do samba que virou um hino em 2019, Manuela Oiticia, a Manu da Cuíca.
“Nós somos bicampeões e eu queria ressaltar o caráter democrático e revolucionário da disputa de samba, que colocou os compositores e compositoras em destaque. O grande homenageado da Mangueira é Jesus Cristo, que luta pela partilha e pela fraternidade. Com certeza, ele aprovaria uma disputa como essa, aprovaria uma escola espetacular que trate a favela como um ato de sobrevivência, especialmente com esse governo que mais mata favelados e o samba mostra que estamos vivos”, declarou a campeã Manu da Cuíca ao Carnavalesco após a vitória. Ela assinou a composição junto de Luiz Carlos Máximo.
A composição destaca a força do samba, exalta a esperança contra a intolerância e relembra a origem pobre de Jesus de Nazaré. “Nasci de peito aberto, de punho cerrado/ Meu pai carpinteiro desempregado/ Minha mãe é Maria das Dores Brasil/ Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira/ Me encontro no amor que não encontra fronteira/ Procura por mim nas fileiras contra a opressão/E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão”, diz uma das estrofes.
Em um dos trechos do samba, há um menção indireta ao presidente Jair Bolsonaro, que tem Messias como sobrenome: “Favela, pega a visão/ Não tem futuro sem partilha/ Nem Messias de arma na mão”.
Para João Paulo Farelli, torcedor da Mangueira e publicitário, a canção resgata a voz da resistência através da figura social e política de Jesus e contrapõe o conservadorismo e o fundamentalismo religioso. “Certamente, hoje, por compaixão, Jesus renasceria ao lado daqueles que carregam diariamente a cruz do preconceito, da intolerância e injustiça social. Afinal, ele é Jesus da gente”, disse.
“Talvez a escuridão que estamos atravessando dure mais do que pensamos, mas a esperança reside no lado esquerdo do peito nos faz acreditar num futuro melhor. Um futuro com partilha e sem Messias de arma na mão”, declarou Farelli à Fórum. “Espero um desfile marcante, onde a verdade prevaleça, essa verdade que nos fará livre”, completou.
https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=jSPhgVEZkWI
Mangueira
Samba que o samba é uma reza
Se alguém por acaso despreza
Teme a força que ele tem
Mangueira
Vão te inventar mil pecados
Mas eu estou do seu lado
E do lado do samba também
Eu sou da Estação Primeira de Nazaré
Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher
Moleque pelintra do Buraco Quente
Meu nome é Jesus da Gente
Nasci de peito aberto, de punho cerrado
Meu pai carpinteiro desempregado
Minha mãe é Maria das Dores Brasil
Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira
Me encontro no amor que não encontra fronteira
Procura por mim nas fileiras contra a opressão
E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão
Eu tô que tô dependurado
Em cordéis e corcovados
Mas será que todo povo entendeu o meu recado?
Porque de novo cravejaram o meu corpo
Os profetas da intolerância
Sem saber que a esperança
Brilha mais que a escuridão
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