Ainda é madrugada quando a população de Pirenópolis (GO), cidade histórica do ciclo do ouro, é acordada ao som de fogos de artifício e banda de música para celebrar a Festa do Divino Espírito Santo. Moradores e turistas se acotovelam nas ruas de pedra do centro histórico em uma alvorada festiva. A população sai em direção à casa do 199º imperador da festa, o advogado aposentado Luiz Carlos Cardoso, que recebe seus súditos com um verdadeiro banquete matinal.
Atualmente, cabe ao imperador o papel de organizador e festeiro da tradição realizada desde 1819. No passado, o personagem símbolo da coroa portuguesa tinha poderes reais até para soltar presos. “É uma honra ter o Divino na minha casa, privilégio que poucos pirenopolinos tiveram em quase dois séculos”, reconhece. Ao logo do ano, um altar improvisado na sala, com a coroa do Divino, recebe visitas de devotos e turistas. A coroa também percorre a cidade e o campo nas folias que antecedem a Pentecoste.
Para celebrar a data, no último domingo (4), o cortejo real seguiu até a matriz acompanhado de turistas e devotos. A programação seguiu a tradição que remonta a origem da celebração, no século XIII, quando a rainha Isabel doou sua coroa ao Divino, no domingo de Pentecoste, para celebrar a paz entre Portugal e Aragão, hoje Espanha.
Durante 70 anos os escravos foram excluídos da festa e, por esse motivo, ainda hoje, os negros realizam o reinado de Nossa Senhora do Rosário e o Juizado de São Benedito, com elementos da cultura afro e cristã, na mesma época. Catiras, congadas, contradança e até pastorinhas (auto natalino) ampliam as opções para quem visita Pirenópolis durante a festa do Divino, além dos já tradicionais atrativos históricos, naturais, da gastronomia e a arte local.
Cavalhadas. Crédito: Rodolfo Vilela
CAVALHADAS – A Festa do Divino marca o início de outra tradição de Goiás. As Cavalhadas vão até setembro em 13 cidades, sendo Pirenópolis a principal delas. Dez mil espectadores lotaram o Cavalhódromo para a abertura da encenação que, ao longo de três dias, relembra as guerras entre cristãos e mouros na Península Ibérica (Espanha e Portugal).
A disputa entre os exércitos reais chegou ao Brasil com os Jesuítas. A representação teatral era uma forma de catequisar índios e escravos ao mostrar o poder dos cristãos, que retomaram os territórios sob domínio mulçumano ao longo de 800 anos. A riqueza de detalhes das vestimentas e adereços que adornam soldados e cavalos dão ao espetáculo o brilho e a pompa de uma corte real.
As evoluções realizadas no estádio de futebol adaptado para as Cavalhadas são intercaladas pelos “mascarados”. São homens e mulheres fantasiados de boi, onça, pássaro e até de capeta. A voz descaracterizada e a fantasia mantêm o anonimato. Desde a véspera, eles invadem a cidade pedindo dinheiro e bebida para animar a festa.
Em sua origem, os mascarados seriam os excluídos das Cavalhadas, já que a batalha resume-se aos 12 integrantes de cada exército. Hoje, eles integram a lista do inventário dos bens culturais que transformaram a festa do Divino e as Cavalhadas de Pirenópolis em Patrimônio Imaterial do Brasil. O turista americano Grant Earnest classificou o festejo como “Interessante e exótica”. O diplomata veio de São Paulo com a esposa Méilee Wong Earnest que se encantou com a grandiosidade da festa e os atrativos culturais e naturais de Pirenópolis.
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