A educação e a juventude brasileiras sofreram mais um duro golpe na noite de ontem (8) com a aprovação pelo Senado Federal da Medida Provisória 746/2016 (Projeto de Lei de Conversão 34/2016) que institui a reforma do ensino médio. O texto segue para sanção do ilegítimo Presidente Michel Temer.
Por Maria Izabel Azevedo Noronha*, na RBA
Mídia Ninja
Quero aqui expressar algumas breves impressões sobre o texto aprovado, sobre o qual a Apeoesp produzirá uma análise mais profunda.
Amplamente rejeitada pelos estudantes, profissionais da educação, no meio acadêmico, entre estudiosos da educação e pela sociedade (consulta pública do Senado apontou 73.454 pessoas contra e apenas 4.545 favoráveis), a reforma do ensino médio foi imposta na forma de Medida Provisória – cuja tramitação é acelerada – para evitar o amplo debate. Tanto assim, que o Ministério Público Federal a considerou inconstitucional. A maioria governista do Congresso Nacional, porém, manteve sua fidelidade ao golpe e a aprovou.
O MEC, a base aliada do governo federal e parte da mídia vêm manipulando as alterações feitas no projeto (como resultado das pressões sociais) para “dourar a pílula”. Devemos ter muito cuidado, pois na realidade pouco mudou de substancial no projeto original.
Jogo de palavras
Se é verdade que Artes, Educação Física, Sociologia e Filosofia são agora consideradas “obrigatórias” na educação básica, é preciso atentar para o fato de que constam no projeto aprovado como “estudos e práticas” a serem definidas na Base Nacional Curricular Comum (BNCC) e não como disciplinas, como atualmente consta na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Na realidade, portanto, o atual governo apagou a conquista dos educadores que haviam conseguido inserir na LDB Sociologia e Filosofia como disciplinas obrigatórias. Não necessariamente serão asseguradas como disciplinas na BNCC, com seus estatutos próprios.
“Bico” na educação
Outro ponto que merece destaque é a manutenção da contratação de profissionais que não têm habilitação para o magistério com base no reconhecimento de seu “notório saber” para ministrarem aulas em cursos técnico-profissionais. É a desregulamentação da nossa profissão, institucionalizando o “bico” de profissionais de outras áreas na educação básica com base em avaliações subjetivas dos sistemas de ensino.
Desigualdades podem aumentar
O governo ilegítimo de Temer continua mentindo na massiva propaganda que faz nos meios de comunicação. O alardeado “direito de escolha” dos estudantes é uma falácia, pois quem definirá a oferta de eventuais conteúdos da parte diversificada do currículo (40% do total) são os sistemas de ensino (leia-se, os secretários de Educação), sem que tenham sido definidos parâmetros de qualidade e temáticas que garantam aos estudantes a equivalência de estudos entre as escolas, em todo o território nacional. O critério, neste caso, não são os interesses e necessidades dos estudantes e da sociedade, mas tão somente as disponibilidades dos entes federados. Alguém duvida de que na maioria dos casos haverá um rebaixamento curricular?
Os sistemas de ensino não são obrigados a oferecer todos os chamados “itinerários formativos”, o que pode contribuir para aumentar as desigualdades regionais e sociais já existentes, desconsiderando o direito da nossa juventude à educação pública de qualidade, qualquer que seja a escola que frequente ou venha a frequentar.
Mais tempo não significa mais qualidade
Finalmente, nesta breve análise, é preciso destacar a imposição da ampliação das escolas de tempo integral e o aumento da carga horária, descolados de uma concepção de ensino médio que ofereça aos estudantes uma formação integrada, que articule a educação com as dimensões do trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura como base da proposta e do desenvolvimento curricular. Este tipo de procedimento ignora os direitos e interesses dos estudantes trabalhadores, os quais, desta forma, serão excluídos dos sistemas de ensino para futuramente, quem sabe, voltarem aos bancos escolares em cursos de Educação de Jovens e Adultos aligeirados e sem qualidade. É este o destino que queremos para a nossa juventude?
O ensino médio precisa mudar para melhor
O que o ensino médio precisa é de mais investimentos, projeto político-pedagógico que atenda as necessidades dos estudantes e do país. Universalização do acesso, políticas que assegurem a permanência dos estudantes, com qualidade e, sobretudo, a implementação do ensino médio como etapa da educação básica que prepare verdadeiramente os jovens para a continuidade dos estudos, para o mundo do trabalho e para a vida.
É preciso assegurar infraestrutura adequada nas escolas, o que a MP 746 não garante. Ao contrário, com o congelamento de investimentos públicos imposto pela PEC 55, já aprovada no Congresso Nacional, a tendência é que as escolas sejam ainda mais precarizadas.
A aprovação da MP 746 é, sem dúvida, um duro revés para todos os que lutam por educação de qualidade no nosso país. De forma alguma, porém, nos deixaremos derrotar. Continuaremos lutando, cada vez mais e sempre.
*Maria Izabel Azevedo Noronha é presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp)
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